O Projeto Embarcatech, uma iniciativa do Governo Federal em parceria com a SOFTEX e a execução pelos Institutos Federais (IFs), nasceu para modernizar o ensino técnico e tecnológico, preparando estudantes para os desafios da Indústria 4.0 e da Escola 4.0. Um dos destaques do projeto é a forte ênfase no uso de hardware livre e tecnologias open source, especialmente no ensino de sistemas embarcados e FPGAs.
No IFCE (Instituto Federal do Ceará), onde o projeto ganhou grande destaque, a metodologia busca unir formação acadêmica com prática de mercado, através da criação de residências técnicas junto a empresas e setores produtivos.
O Perfil do Projeto
O Embarcatech é estruturado em duas grandes fases, cada uma com uma progressão natural de complexidade e foco prático:
- Fase 1: Introdução a sistemas embarcados, computação de borda (edge computing) e Internet das Coisas (IoT), além de introdução à programação na linguagem C/C++. Nesta etapa, o objetivo é familiarizar os estudantes com os conceitos fundamentais de hardware e software embarcado, redes de dispositivos inteligentes e desenvolvimento de aplicações conectadas.
- Fase 2: Expansão para tópicos avançados, com inclusão do sistema operacional de tempo real FreeRTOS e o estudo da arquitetura Cortex-M (linha de microcontroladores baseada na arquitetura ARM), além do aprofundamento em lógica programável (FPGAs). Essa fase visa preparar os alunos para projetar sistemas embarcados robustos, multitarefa e prontos para aplicações industriais e acadêmicas de ponta.
As Placas Utilizadas no Projeto
Duas placas são protagonistas nessa jornada tecnológica:
1. BitDogLab
A BitDogLab é utilizada desde a primeira fase do projeto e continua sendo a base na segunda fase. É uma placa compacta e poderosa para introdução em:
- Sistemas embarcados de baixo custo;
- Programação C/C++;
- Comunicação de sensores, atuadores e redes;
- Conceitos básicos de FreeRTOS e arquitetura de computadores.
Ela serve como ponto de partida ideal para quem está dando os primeiros passos em sistemas de controle, IoT e processamento embarcado.
Importante: Embora a BitDogLab continue sendo referência acadêmica no projeto, as empresas onde os alunos bolsistas realizarão suas residências técnicas podem utilizar plataformas diferentes conforme suas necessidades de mercado.

2. Colorlight i5 – Módulo i9 FPGA (Lattice ECP5)
Na segunda fase, voltada à trilha FPGA, foi introduzida a placa Colorlight i5, também chamada de Módulo i9, baseada no FPGA Lattice ECP5 — uma escolha que casa perfeitamente com a filosofia do projeto.
Características Técnicas da Colorlight i5 (Módulo i9)
- FPGA: Lattice ECP5 LFE5U (diferentes modelos: 25K, 45K ou 85K LUTs);
- Conectividade: USB para programação e comunicação;
- Recursos I/O: Vários pinos de entrada e saída distribuídos em headers;
- Memória: SRAM externa disponível para projetos mais complexos;
- Toolchain: Utiliza cadeia de ferramentas open-source como Yosys, NextPNR e OpenOCD, o que elimina a dependência de licenças proprietárias;
- Custo: Extremamente acessível em comparação com FPGAs tradicionais, democratizando o acesso ao hardware de ponta.
Essa placa é, portanto, uma porta de entrada perfeita para ensino de circuitos digitais, arquitetura reconfigurável, aceleração de hardware e criação de sistemas altamente paralelos.

A Escola 4.0 e a Formação dos Alunos
O conceito de Escola 4.0 vai muito além da tecnologia: ele propõe uma educação mão-na-massa, focada na solução de problemas reais, colaboração entre áreas distintas e uso intensivo de novas tecnologias abertas.
O Embarcatech se encaixa perfeitamente nesse paradigma ao:
- Empoderar o estudante como protagonista do seu próprio aprendizado;
- Reduzir a dependência de tecnologias proprietárias, incentivando o conhecimento profundo do hardware e do software;
- Aproximar academia e indústria, por meio das residências técnicas, onde os alunos aplicam diretamente o que aprendem em problemas práticos das empresas.
A filosofia é clara: formar não apenas técnicos, mas líderes tecnológicos para a nova economia.
Visão para o Futuro
O Projeto Embarcatech marca apenas o começo de uma nova era para o ensino tecnológico nos Institutos Federais e, por consequência, para o próprio cenário industrial e científico brasileiro.
À medida que o programa amadurece, novas oportunidades se abrem para expansão e evolução:
1. Expansão para Tecnologias Emergentes
Com a base sólida construída em microcontroladores ARM Cortex-M e FPGAs Lattice ECP5, a trilha natural aponta para a inclusão de novas arquiteturas como:
- Processadores RISC-V, que vêm ganhando força mundialmente pela filosofia open hardware;
- Sistemas heterogêneos, combinando CPU + FPGA, permitindo projetos de altíssimo desempenho para aplicações em visão computacional, redes neurais e IoT industrial.
Essas tecnologias fortalecerão ainda mais a capacidade dos alunos de inovar em campos estratégicos como defesa cibernética, agricultura de precisão, energia renovável e mobilidade elétrica.
2. Avanço da Inteligência Artificial Embarcada
A evolução natural do Embarcatech também aponta para o fortalecimento do ensino de IA embarcada (ou TinyML), onde modelos de aprendizado de máquina são otimizados para rodar em dispositivos de baixíssimo consumo.
Com o domínio de FPGAs e FreeRTOS, os alunos estarão prontos para construir:
- Redes neurais personalizadas em hardware (accelerators);
- Dispositivos de inferência offline em IoT (Edge AI);
- Aplicações críticas em saúde, segurança pública e indústria 4.0.
3. Residências Técnicas em Empresas de Alta Tecnologia
Com a maturidade da formação dos bolsistas, abre-se a possibilidade de ampliar as residências técnicas não apenas para empresas locais, mas para polos tecnológicos de referência nacional e internacional. Estudantes poderão atuar em:
- Centros de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D);
- Startups de tecnologia avançada;
- Institutos de inovação com foco em hardware aberto e soberania tecnológica.
Essa conexão estreita entre a academia e o setor produtivo solidificará o papel do Embarcatech como berço de talentos estratégicos para a transformação digital do país.
4. Massificação do Ensino de FPGA nas Escolas Públicas
A experiência positiva com plataformas acessíveis como a Colorlight i5 pode abrir caminho para programas nacionais que levem o ensino de circuitos digitais e lógica reconfigurável para a educação básica e técnica.
Sonha-se com o dia em que será tão natural ensinar o aluno a criar seu próprio processador FPGA como hoje se ensina lógica de programação em um computador pessoal.
Essa democratização do conhecimento tecnológico representa o verdadeiro espírito da Escola 4.0: acesso, protagonismo e inovação desde cedo.
Considerações Finais
O Projeto Embarcatech é, acima de tudo, uma revolução silenciosa na maneira como formamos nossos futuros profissionais de tecnologia no Brasil. Ao adotar uma abordagem prática, alinhada às demandas da Indústria 4.0 e da Escola 4.0, ele transcende o ensino tradicional, colocando os estudantes em contato direto com tecnologias de ponta — desde sistemas embarcados clássicos até a lógica programável com FPGAs.
A escolha cuidadosa das plataformas, como a BitDogLab para introdução e consolidação de fundamentos, e a Colorlight i5 FPGA para exploração avançada de arquiteturas reconfiguráveis, demonstra um compromisso sério com a formação de competências técnicas profundas. Ainda mais importante, a adoção de ferramentas open-source em todos os estágios do aprendizado promove não apenas a soberania tecnológica, mas também o empoderamento intelectual dos estudantes, estimulando o raciocínio crítico, a autonomia e a criatividade.
Além da sólida base técnica, o projeto desenvolve habilidades humanas essenciais — comunicação, colaboração, liderança e pensamento sistêmico — moldando profissionais capazes de inovar, empreender e transformar a sociedade.
O IFCE, assim como outros Institutos Federais participantes, se posiciona como protagonista na construção de uma nova geração de talentos, prontos para atuar não apenas no mercado nacional, mas em qualquer ecossistema global que valorize inovação, ética e excelência técnica.
O Embarcatech não é apenas um projeto educacional: é a semente de uma mudança cultural que reconhece a educação tecnológica como um motor essencial para o desenvolvimento do país.